Estava nas proximidades e pensei ir ao evento...
Como toda boa baiana, olhei o tempo chuvoso!
Baiano tem resistência em sair quando chove e hoje é, era, ou será Parada Disney? Afinal choveu, e no mínino, num bom cálculo baiano, esse desfile vai sair mais tarde. Ora, “na Bahia” funciona assim...
Estava curiosa e lá fui eu com o Filhote assistir o tal desfile, Filhote que já não é mais um Filhotinho, porém sim, um Filhotão.
Nossa! Quando cheguei ao Jardim de Alá, que ainda continua de Alá lembrei a canção “Foi um rio que passou na minha vida e o meu coração se deixou levar...” Muita gente, uma correnteza, uma enxurrada colorida. Senti uma alegria inusitada com aquela dinâmica do coletivo e ingressei na correnteza, logo então percebi que havia um fluxo de maré e contra maré.
Que estava acontecendo?
Então perguntei a um senhor que caminhava na mesma direção, sentido Aeroclube, afinal o desfile já passou? Ele respondeu: Esse desfile parece o trem bala, a gente vai chegando e ele já passou, a gente corre e não consegue alcançar. Ele tinha acabado de descrever a sensação que senti na minha teimosia em “pegar o trem”.
A tal Avenida Otávio Mangabeira, parecia não conseguir conter o número de pessoas, havia sido dividida em três partes: a do centro, o local do desfile e nas laterais, uma ladeando as construções e outra ladeando a costa, o litoral ou a orla marítima, conforme queiram vocês, destinada as pessoas que na sua dinamicidade construíam duas correntes que em ambos os lados continha maré e contra maré humana e dificultava o fluxo de quem já havia assistido ao desfile ou desistido dele, e aqueles que como nós teimavam em ver os personagens Disney, parte do nosso imaginário coletivo como Branca de Neve, Belas Adormecidas e etc. e tal. Nesse ínterim encontrei num garotinho que chorava querendo ver o Mickey. Olhei para a senhora que estava ao seu lado, tudo indicava sua mãe, e ela disse “estou correndo para acompanhar e ver se mostro a ele, mas esse tal desfile parece mais uma miragem, água no deserto, quando a gente pensa se aproximar parece que ele desaparece.
Nesse momento, eu e um senhor nos aproximamos dos homens que amparavam a barreira construída de grades de alumínio e bloqueavam o centro, local onde o desfile passara e pedíamos a eles que abrissem as grades para facilitar os acessos da multidão, e eles insistiam em mantê-las cerradas. Um deles, o chefe do grupo disse-nos que obedecia a ordens, que ali ele não passava de apóstolo. Respondi que seu Deus não tinha feito nenhum curso de planejamento urbano e jamais havia coordenado um evento porque o que se passava era tudo que um professor de eventos diria aos alunos que era um exemplo do que não se deveria fazer.
As pessoas estavam perplexas... Como uma festa poderia ser tão rápida? Menos de meia hora?
Para quem é da city baiana haverá de compreender o espanto. Afinal, baiano não conhece festa tão rápida... Nossas festas duram uma noite, ou um dia, três dias, ou, no mínimo um turno. E agora essa bendita festa logo depois de uma chuva, que começa com uma rigidez de horário inglês em plena Bahia e, ainda diga-se mais, uma festa principalmente para crianças com o patrocínio Nestlé e Disney!...
Em nenhum momento da minha vida tive tanta certeza da benevolência do nosso povo, da sua flagrante oralidade e da paciência que é também uma forma de amar.
Tentávamos conseguir alternativa para caminhar mais rápido, queríamos ver alguma fresta da festa que insistia em nos convidar e em ignorar nossa pretensão.
Ao tentarmos construir uma passagem pela praia que era mais rápido, uma jovem senhora olhou prá mim e disse: Olhe quem saiu com chuva se deu bem, porque baiano não gosta de sair com chuva, e eu como toda baiana feita de açúcar esperei a chuva passar pra não desmanchar e perdi a festa. E outra acrescentou: aprendi que quem não usa hidratante carrega a sombrinha.
Meu Filho olhou prá mim e disse que sua colega telefonou que vem uma hora da tarde prá festa. Eu sorri, era tudo que podia fazer.
Enfim chegamos ao Aeroclube e um homem ou tentava ou impressionava quem passava impulsionando com o dispositivo de fogo o lançamento de um balão e que não era balão de papel não!
Seguíamos com toda aquela multidão, como se fora o carnaval, uma grande festa de São João para tentar ver alguma coisa e “não voltar à zero”.
Subimos naqueles pequenos morros que delineiam colinas no Aeroclube e vimos o carro alegórico do castelo da Disney e uma casinha fantasia já vazia dos seus personagens. Era tudo que restava para ser visto e ainda vinha uma imensa multidão para ver a festa.
Naquele momento os motoristas tentavam conduzir os belos ônibus que retiravam os figurantes, personagens da festa, tentando dar partida. E você pensa que o povo deixou? Qual o quê? Fizeram iguaiszinhos fazem no trio elétrico para reter o caminhão. Bloquearam o caminho dos ônibus que somente saíram quando os motoqueiros da polícia chegaram.
Agora imaginem o que passou pela cabeça dessas pessoas de outra cultura sobre aquela situação, certamente que fossem ignorantes, vândalos, quinto mundistas, e apenas as pessoas que ser felizes, ver a festa, começar tudo de novo, e certamente serem tratadas de uma forma melhor pelos seus políticos, seus governantes, seus representantes inclusive também aqueles que acabam de receber homenagem pelo desempenho no turismo.
Em seguida, estávamos regressando quando o Governador saia de carro do Aeroclube e começou a acenar para a população que lhe retribuiu em vaias. Foi a forma mais gentil e educada que pude presenciar de um protesto de uma população carente de lazer, cultura e nutrindo um profundo sentimento de desrespeito pela absoluta falta de informação e planejamento que orientasse sobre o evento. Vale lembrar que para grande parcela dessa população falta tudo e não podem perder a fé para não enlouquecer ou partir para o vandalismo. Uma população menos educada e paciente teria naturalmente agido de forma bem menos gentil.
Fiquei a refletir sobre a atitude do Governador, inocência ou total distanciamento do sentimento do povo naquele instante. Ele é um homem sensível, eles não vaiavam a pessoa do Governador, porém endereçavam a ele a comunicação do seu desencanto, sua tristeza, sua falta de prazer, o fiasco que fora o evento.
E ele, o Governador atual, o que estaria pensando?
Como foi a articulação desse evento entre os empreendedores, o governo municipal e o governo estadual?
Aí me flagrei imaginando uma aliança entre o Governador e o Prefeito, pessoas que admiro como seres humanos mesmo distante de vínculos políticos e pensei que se assim fosse seria melhor para a população...
Naquele momento eu também era uma daquelas pessoas que tinha ido ali movida pelo encantamento do imaginário e nós voltávamos cansadas, injuriadas e desencantadas. E observem que havia muitas mães, pais e crianças presentes no encontro, “embora tanto desencontro pela vida” como diria Vinicius de Moraes, pois para maioria dos convidados não passou de uma pretensa fantasia a festa da fantasia.
No retorno, ao caminharmos juntos, ouvi coisas assim: Uma criança de aproximadamente quatro anos chorava, seu chapéu de papelão havia caído no chão. Uma senhora exclamou “agora só faltava um bang-bang!”. Outra jovem disse “ é melhor beber um pouco antes de voltar prá casa”, ainda comentários como “eu comecei a caminhar há dois dias e hoje eu fui quase que correndo do Jardim de Alá ao Aeroclube”. Dentre essas pessoas, uma Mãe muito jovem, parecia uma pessoa com muito pouco recurso; parou numa barraca onde o dono não sabia se abria o côco, se recebia o dinheiro ou se partia o côco no meio para os solicitantes, e nesse contexto essa jovem mãe declarou: Eu acho que o Prefeito não se importa com os sonhos de uma criança, nem a de 06 meses, nem a de dois anos, nem a de cinco anos”. E um jovem senhor comentava sobre qual foi a verba destinada e para quem, afinal a população merecia ser informada, a cidade ficou com o filet da sua orla totalmente interditado do Jardim de Alá até o Aeroclube em pleno domingo, várias secretarias e muitas pessoas foram mobilizadas para participarem do evento...
Continuo a me indagar sobre a forma como nossos governantes fazem política e sobre o poder do Estado em desarticular ou insensibilizar lideranças; em que bases nossos políticos constroem alianças sem pensar na população, no ser humano; como as culturas fazem leituras diferentes para uma mesma situação e como é necessário um maior cuidado com o planejamento de eventos.
Mas enfim hoje é domingo, a vida é curta a natureza estava linda e resolvemos então salvar o lado artístico do dia em festa fazendo fotos pessoais, da população, do evento e da bela paisagem do Jardim de Alá.
Salve, Salve Salvador Alá, Maomé, Buda, Deus, Mãe Divina, Abraão, Tupã, Cristo, Nossa Senhora, Deuses de todos os cultos e Babalorixá da Bahia.
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